As lições do Porto de Hamburgo

Em janeiro último, tive a chance de visitar Hamburgo, na Alemanha, para conhecer o complexo portuário da cidade e finalizar minha dissertação de mestrado, que trata da competição entre terminais de contêineres na região sul do Brasil. Ao final da pesquisa, todas as expectativas se confirmaram e uma certeza ficou ainda mais forte dentro do que penso sobre o sistema portuário brasileiro: como é necessária a melhoria imediata das relações entre poder público, sindicatos e empresas operadoras, de modo que possamos avançar ainda mais em nosso comércio internacional.

Primeiramente, deve-se ter em mente que a movimentação total de contêineres é o resultado da interação de uma série de fatores. O modelo de administração dos portos brasileiros, chamado landlord, parte do princípio de que a infra-estrutura de acesso é de responsabilidade do poder público – representado em sua última instância pelas Autoridades Portuárias – e a chamada superestrutura (equipamentos de movimentação) da iniciativa privada, que tem como seus representantes os arrendatários de terminais, como é o caso do Teconvi em Itajaí e do TCP em Paranaguá, por exemplo. Aí já temos duas figuras relevantes do cenário portuário. Somam-se a elas os trabalhadores portuários, representados pelos seus respectivos sindicatos, e demais agentes do sistema, como os órgãos intervenientes, armazéns retro-portuários, etc.

Em Hamburgo, o modelo de administração é o mesmo. O que difere bastante de nossa realidade, no entanto, são os resultados obtidos. Em 2005, o porto de Hamburgo ficou com o oitavo lugar dentre os maiores portos de contêineres no mundo, com incríveis 8.087.545 TEU’s movimentados. Este número é relativamente modesto se comparado aos 23.192.000 TEU’s operados em Singapura. No entanto, a movimentação de Hamburgo consegue ser maior que a movimentação de todos os portos brasileiros juntos, que ficou em 5.869.731 TEU’s em 2005.

Hamburgo conta com duas empresas operadoras de contêineres: a HHLA, que tem 3 terminais, e a Eurogate, que conta com um terminal. Altenwerder, um dos terminais da HHLA, movimentou 1.780.000 TEU’s em 2005. Neste mesmo ano, TECONVI, TCP e TECON Rio Grande movimentaram juntos 1.727.550 TEU’s. Por que somente um terminal movimenta mais que os nossos três terminais privados da região sul? A construção de uma resposta para esta pergunta renderia um belo trabalho de conclusão de curso, pois são inúmeros os fatores que explicam esta diferença, dentre os quais se destaca a região econômica atendida pelos terminais. No entanto, dois outros fatores são marcantes entre a realidade de Hamburgo e da região sul: o papel da Autoridade Portuária e o poder de sindicatos.

Sobre a realidade do porto de Hamburgo podemos destacar:

- Desde outubro de 2005, a Autoridade Portuária tornou-se independente de seu Ministério, possuindo um orçamento próprio e tendo ainda a chance de buscar financiamentos junto ao mercado financeiro de modo a realizar obras mais rapidamente;

- A Autoridade Portuária trabalha unicamente como um órgão planejador e executor de obras, de modo a facilitar o acesso de cargas e o deslocamento das mesmas para o seu destino;

- Há somente um sindicato de trabalhadores portuários em Hamburgo. Geralmente, somente quando um trabalhador é contratado para uma empresa do sistema é que ele vem a fazer parte do sindicato, e não o contrário.

- O sindicato de trabalhadores portuários em Hamburgo é o resultado da fusão de diversos outros sindicatos ao longo das últimas décadas e não representa, de forma alguma, um impacto expressivo nos custos finais dos terminais.

No Brasil, vemos que as coisas são um pouco diferentes:

- Nossas AP’s, de uma forma geral, estão super-dimensionadas para as necessidades dos portos em que atuam, tanto em número de funcionários como em estrutura;

- Há interferência política no dia-a-dia dos terminais por parte das AP’s.

- O objetivo maior das AP’s, que é o de prover infra-estrutura, acaba sendo engessado pela falta de recursos do poder público e pela ausência de mecanismos extras de captação;

- A história dos sindicatos no Brasil e as relações estabelecidas em lei entre contratantes e trabalhadores acabam “colaborando” ainda mais para o aumento do chamado custo-Brasil. Em alguns terminais, os custos com mão-de-obra chegam a mais de 40% do total do faturamento bruto.

Quais as lições do porto de Hamburgo? Tenho a convicção de que não perdemos em nada para alemães ou quaisquer outros povos, quando se trata de capacidade e vontade de melhorar. Temos nossa forma de fazer negócios e de buscar nossos objetivos. No entanto, não podemos ignorar a experiência de sucesso de outros países e empresas. Precisamos tornar os negócios no sistema portuário ainda mais profissionalizados, reduzir custos dia após dia e, principalmente, quebrar com as amarras históricas e políticas que tanto comprometem o nosso progresso. Hamburgo é um ótimo exemplo de como o poder público, sindicatos e terminais podem trabalhar juntos em prol de desenvolvimento e resultados. Façamos de Hamburgo um exemplo de sucesso a ser seguido.