O relatório publicado ontem (31) pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) sobre Transporte Marítimo 2019 abrange cinco principais áreas do transporte marítimo: frete marítimo, frota mundial, tarifas e mercados, portos e infraestrutura, além de regulação. No estudo observa-se que, apesar dos contratempos enfrentados pela indústria, o volume total de comércio marítimo atingiu 11 bilhões de toneladas no ano passado. O relatório ainda revela que os volumes de comércio marítimo cresceram apenas 2,7% em 2018, caindo abaixo da média histórica de 3%.
Como resultado, o crescimento global do tráfego de contêineres também caiu de 6%, em 2017, para modestos 2,6% em 2018, enquanto o crescimento da taxa de transferência de portos de contêineres também caiu para 4,7%, dos 6% para o mesmo período. Essa desaceleração do crescimento afetou quase todos os segmentos de carga marítima, com destaque o tráfego portuário global e o comércio de contêineres.
Um dos possíveis fatores de queda no crescimento do comércio marítimo, segundo o relatório, é resultado do enfraquecimento do sistema multilateral de comércio e o crescente protecionismo, ou seja, uma modificação significativa nos padrões de globalização diante da regionalização dos fluxos comerciais e das cadeias de suprimentos. De acordo com a UNCTAD, e de forma diferente, a Organização Mundial do Comércio (OMC) levou o mercado internacional à proliferação de acordos regionais de comércio, enquanto incertezas comerciais causadas por tensões no Oriente Médio, Brexit e pela guerra comercial entre os EUA e a China, em particular, paralisaram o crescimento econômico global.
Assim, segundo o estudo, o desequilíbrio entre oferta e demanda reduziram as taxas de frete nas rotas principais de comércio de contêineres durante o primeiro semestre de 2018, provocando o declínio da taxa de frete, devido ao contínuo envio de meganavios implantados no comércio transpacífico. Mas, apesar disso, o comércio marítimo internacional ainda deve se expandir a uma taxa média anual de crescimento de 3,4% entre 2019 e 2024, sendo impulsionado, em particular, pelo crescimento de cargas em contêineres, a granel e gás.
Em paralelo à turbulência, o relatório descreve os desafios ambientais que a indústria marítima enfrenta. Entre eles está o próximo regulamento da IMO 2020, que reduz o limite de enxofre no óleo combustível para navios de 3,5% para 0,5%, e que entrará em vigor em 1º de janeiro de 2020. Como resultado, os armadores devem estar preparados para um aumento esperado nos custos do combustível dos navios, resultante de uma nova regulamentação que exige a redução nas emissões de dióxido de enxofre.
Contudo, e de forma positiva, a indústria colaborou para o desenvolvimento do setor de gás natural liquefeito, levando a sua expansão, como resultado da pressão intensificada para promover fontes de energia mais limpas. Por fim, o relatório afirma que está em elaboração um “novo padrão” para o transporte marítimo, com “efeitos que permeiam todos os aspectos da indústria, da demanda ao suprimento, mercados, portos e estruturas regulatórias”.
Interessante destacar que o estudo cita o Brasil e o Porto de Santos como exemplo no tratamento dos fatores que influenciam a competitividade portuária, destacando o impacto na concorrência e competitividade portuárias na Logística relacionada ao acesso ao transporte marítimo.
A capacidade operacional do porto, de receber navios maiores, é percebida como um imperativo para manter a competitividade, enquanto a incapacidade operacional neste sentido resulta na perda de conexões marítimas ou na necessidade de transbordo, induzindo custos mais altos de frete. O documento ainda aponta que a integração vertical entre empresas de transporte e operadores de terminais pode afetar a concorrência se todos os terminais de um porto forem controlados pela mesma empresa e, essa empresa, se fundir com uma empresa de transporte. Nesse caso, a entidade resultante da fusão terá um incentivo para discriminar outras empresas de transporte, prestando serviços de menor qualidade ou cobrando preços mais altos.
Já a logística relacionada ao acesso ao transporte terrestre, segundo a UNCTAD, é tão importante para a competitividade do porto quanto o acesso às redes de transporte marítimo. Ainda segundo o documento, “é provável que haja um impacto negativo nas atividades do operador do terminal, mesmo que o operador seja altamente eficiente, devido à falta de conexão eficaz entre terminal e centros de produção, distribuição e consumo. A necessidade de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento de mercados de frete competitivos que abranjam toda a cadeia logística, por exemplo, alinhando incentivos relacionados a concessões ferroviárias e portuárias, por exemplo no Brasil”.
O documento na íntegra pode ser acessado em: https://unctad.org/en/PublicationsLibrary/rmt2019_en.pdf