quinta, 18 de abril de 2024
25/02/2019 16:21

Apesar de falar em corte de gastos, governo do Estado aumenta o teto salarial de servidores

Aqueles que já recebiam os maiores salários passaram a receber valores ainda mais altos em virtude do efeito cascata provocado pelo reajuste do STF. PGE não foi consultada sobre o assunto

Em novembro de 2018 o Senado Federal aprovou um reajuste de 16,38% no salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do procurador-geral da República. O reajuste concedido elevou o subsídio de R$ 33,7 mil para R$ 39 mil, provocando um efeito cascata em todo o funcionalismo público, visto que alterou o teto constitucional, parâmetro que determina os vencimentos de várias carreiras públicas federais e estaduais.

Em Santa Catarina, após o reajuste do STF, o teto constitucional passou a ser de R$ 35.466,22, o que corresponde ao salário mensal dos desembargadores do Tribunal de Justiça. O valor representa 90,25% do subsídio dos ministros do Supremo e foi definido em dezembro de 2013, por meio de uma Emenda na Constituição estadual. A regra limitou a remuneração dos ocupantes de cargos públicos da administração direta, autarquias e fundações, dos membros dos Poderes do Estado, do Ministério Público e do Tribunal de Contas.

Entretanto, em Santa Catarina, esse ‘efeito cascata’ refletiu de maneira seletiva. Isso porque nem todas as categorias foram beneficiadas com o aumento do teto constitucional. Até o momento, num universo de 123.962 servidores, entre ativos e inativos, apenas 900 foram beneficiados pela medida, o que já causa um impacto de R$ 72 milhões anuais na folha de pagamento do Estado.

Procurada, a assessoria da Secretaria de Administração afirma que esse é o número total de beneficiados (900). Porém, é possível verificar no Portal da Transparência do governo que diversas categorias não tiveram o teto atualizado. Mesmo dentro de algumas delas, alguns servidores passaram pela atualização do teto e outros não. Ou seja, o impacto poderá ser ainda maior, caso seja aplicado a todos.

Contas no vermelho

Conforme determinado pela Lei de Responsabilidade Fiscal, o limite máximo para gastos com pessoal é de 60% da Receita Corrente Líquida (RCL) do Estado, quando incluídos os demais poderes. A distribuição do percentual ocorre da seguinte forma: 49% para o próprio Executivo; 3% para o Legislativo, incluindo aí o Tribunal de Contas; 6% para o Poder Judiciário; e 2% para o Ministério Público. Os valores estão no âmbito do duodécimo repassado anualmente aos poderes. De acordo com o Tesouro Nacional, o comprometimento de Santa Catarina está em 60,57%, já ultrapassando o limite legal.

Ao considerar apenas os salários dos servidores do Executivo, o valor chega a 48,76% da RCL. Ainda segundo informações da Secretaria de Administração, mesmo com o aumento do teto, o índice permanecerá dentro 49% permitidos. Contudo, abre-se aí uma perigosa possibilidade do Estado estar próximo de desobedecer determinações da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Entretanto, outras controvérsias surgem neste contexto.

Apesar do governo afirmar que o aumento do teto gera um efeito cascata inevitável, as Constituições Federal e Estadual preveem que a remuneração dos servidores públicos somente poderá ser fixada ou alterada por meio de lei específica, o que, neste caso, não aconteceu. Após o reajuste do STF, em novembro do ano passado, nenhum projeto tramitou na Assembleia Legislativa com tal finalidade. O que houve, então, é que o Executivo usurpou uma função que cabe somente ao Legislativo.

Por outro lado, a Secretaria de Administração considera que a legislação catarinense não prevê nenhum procedimento diferente do que foi adotado, e que se trata de um desbloqueio do teto salarial, uma atualização, e não um reajuste na remuneração.

Mesmo com tantas implicações legais e diante do risco de o Estado ultrapassar o limite imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal quanto ao gasto com pessoal, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) sequer foi consultada se o desbloqueio do teto salarial deveria ou não ser autorizado. Em resposta por meio da Assessoria de Imprensa, a informação é de que o assunto não chegou à PGE. Sem isso, o índice foi aplicado sem qualquer análise jurídica.

Contradições

O fato é que a medida vai na contramão do discurso de corte de gastos, repetido por Carlos Moisés desde o período de transição de governo. Em diversas manifestações públicas, as palavras de ordem do Executivo têm sido ‘contenção de despesas, ‘enxugamento da máquina’ e ‘calamidade financeira’. Além disso, aponta no horizonte um novo desgaste com o legislativo, reforçado pelo fato de outros estados submeterem a mesma decisão ao crivo dos parlamentares.

É o caso de São Paulo, que não aplicou o índice de forma integral. Ainda no mês de dezembro, logo após o reajuste dos ministros do STF, o governo daquele estado enviou à Alesp um projeto de lei tratando dos subsídios para os cargos de governador, vice e secretários, o que consequentemente torna-se o teto para o quadro de servidores. O texto limitou a maior remuneração do Executivo paulista em aproximadamente R$ 23 mil. Valor cerca de R$ 12 mil abaixo do praticado em Santa Catarina.

O Artigo 23 da Constituição catarinense limita o teto do funcionalismo ao percentual de 90,25% daquele pago no STF. Ou seja, autoriza, mas não obriga a chegar aos 90,25%.

SC de fora

Recentemente, oito governadores assinaram uma carta direcionada ao presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, pedindo à Corte o restabelecimento da medida que prevê a possibilidade de redução da jornada de trabalho de servidores públicos e consequentemente dos correspondentes vencimentos. O dispositivo poderia ser acionado em casos de frustação de receitas, por exemplo. Santa Catarina não participou do pedido, mesmo já tendo ultrapassado o limite de 60% de comprometimento da Receita Corrente Líquida com folha de pagamento, considerando, neste caso, todos os Poderes estaduais.




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