quinta, 18 de abril de 2024
11/07/2018 09:30

Associações divergem sobre regulação de armadores estrangeiros

O Centronave identifica no Brasil um excesso regulatório que aumenta a burocracia e pressiona os custos do setor com efeitos para toda cadeia produtiva

Importadores e exportadores do Rio de Janeiro manifestaram apoio à Confederação Nacional da Indústria (CNI), que publicou documento apontando a necessidade de redução do poder de mercado dos armadores estrangeiros no setor aquaviário brasileiro por meio de mais fiscalização do regulador. O grupo é representado pela Associação dos Usuários dos Portos do Rio de Janeiro (Usuport-RJ) que encaminhou, na última terça-feira (3), uma carta com considerações sobre o tema à presidência da CNI. No final de junho, representantes dos armadores estrangeiros haviam questionado esse mesmo estudo e fizeram ponderações à confederação sobre falta de fundamentação técnica.

Os usuários entendem que a representatividade da CNI no debate sobre a regulação dos armadores estrangeiros é benéfica ao setor e ao comércio exterior brasileiro. “A concentração de mercado, com consórcios entre armadores restringindo cada vez mais as opções dos usuários, é algo extremamente preocupante”, destacou na carta o presidente da Usuport-RJ, André de Seixas. A associação alega que os usuários devem cobrar regulação técnica e eficiente para evitar ter que pagar cada vez mais encargos. A entidade defende que os armadores estrangeiros precisam de registro na Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).

O Centro Nacional de Navegação (Centronave) manifestou “estranhamento” à recente reportagem do Jornal Valor Econômico sobre o estudo da CNI. Por carta, o Centronave considerou que houve “generalização superficial” e “sem sustentação técnica” quando mencionado que a movimentação de contêineres estaria sendo excessivamente onerosa para os exportadores em razão da alta concentração de mercado entre os armadores. O presidente do conselho de administração do Centronave, Julian Thomas, destacou no ofício que os fretes no transporte marítimo global têm estado abaixo dos que eram praticados há mais de uma década, em alguns casos mais de 50%.

Segundo Thomas, ainda como resultado da crise econômica mundial (2007/2008) e do crescimento da oferta de serviços e de espaços pelos armadores, o que acirrou concorrência entre os players desse mercado. Além disso, Thomas apontou a expansão das frotas com embarcações maiores e mais modernas. "O conjunto desses fatos levou o segmento a um movimento de alianças operacionais, sem as quais o transporte marítimo global seria inviabilizado do ponto de vista econômico-financeiro”, concluiu.

Os usuários também alegam que a norma de afretamento da Antaq (RN-1/2015) restringe a frota nacional de cabotagem a apenas 20% do segmento, ficando o restante com navios estrangeiros. Em decisão favorável a uma das associadas da Usuport-RJ, o Tribunal de Contas da União (TCU) suspendeu parcialmente, de forma preventiva, itens da norma de afretamento. Segundo a associação, as regras da norma são responsáveis por concentrar 80% do volume da cabotagem em poucas empresas brasileiras, todas controladas por grupos estrangeiros.

Na carta apresentada à CNI, a Usuport-RJ também discordou da manutenção do caráter ressarcitório da cobrança do serviço de movimentação de cargas (THC) na proposta de revisão da norma 2.389/2012 da Antaq, que esteve em audiência pública até o dia 26 de junho. A associação aponta que a agência não cobra que os armadores estrangeiros comprovem o ressarcimento, ainda que quando solicitado pelos usuários. Exportadores e importadores estimam pagar três a quatro vezes a mais aos armadores estrangeiros, considerando aquilo que eles pagam a título de THC aos terminais portuários. “Estamos certos de que, quando publicada, a norma não trará obrigatoriedade alguma para o armador comprovar o ressarcimento do THC aos usuários”, avaliou a entidade na carta. 

O Centronave, por sua vez, também não compreendeu o estudo da CNI ter apontado deficiência de fiscalização do poder público. A associação avalia que órgãos do Estado brasileiro não devem ou podem intervir na oferta e na demanda de serviços globais de transporte marítimo, definindo os preços a serem praticados, na contramão das regras que pautam o livre mercado e a iniciativa privado. Os armadores entendem que o estudo da CNI deveria ser substituído por outro documento que considere dados técnicos de mercado, de forma objetiva, e livre da visão ideológica que teria solicitado mais intervencionismo estatal, o que seria incompatível com estudos produzidos por entidades do setor privado.

O Centronave identifica no Brasil um excesso regulatório que aumenta a burocracia e pressiona os custos do setor com efeitos para toda cadeia produtiva. Segundo a associação, a burocracia representa obstáculo para o setor, bem como os gargalos estruturais. "São obstáculos que precisariam ser solucionados tendo em vista a redução de custos logísticos, a fim de garantir maior competitividade aos nossos exportadores", ponderou a associação na carta. 

A CNI agradeceu as contribuições e ressaltou, também por carta, que preza pela eficiência e pelo livre mercado, sempre com foco no aumento da competitividade do setor industrial brasileiro. Na resposta obtida pela Portos e Navios, a CNI defendeu a fiscalização e a regulação do transporte marítimo pela Antaq, inclusive as atividades do armador estrangeiro. A confederação observa que a concentração da oferta de serviços de transporte marítimo de contêineres aumentou significativamente, com tendência de elevação sistemática ao longo dos anos. Entre 1995 e 2017, segundo levantado pela CNI, os 10 maiores transportadores marítimos passaram de 38% para 74% da capacidade mundial. "Até a crise de 2008, era possível para os armadores crescerem de forma acelerada pelo aumento da capacidade de movimentação com novos navios, em parte graças à rápida expansão do comércio global. Desde então, a alternativa mais rápida para ganhar escala passou a ser a 'compra' de market sharepor meio de consolidação", disse a CNI na carta assinada por seu presidente, Robson Braga de Andrade.

No Brasil, essa consolidação teria levado a uma reorganização do tráfego, com diminuição da oferta de serviços no transporte internacional. A CNI diz que, após sucessivas quedas do frete básico desde 2009, os armadores reduziram a capacidade da rota Xangai-Santos em 38% em 2016, elevando em 261% (em US$) o preço básico médio do frete no ano, retornando ao patamar pré-crise. A confederação apurou que sete dos principais terminais de contêineres brasileiros considerados verticalizados responderam por 44,8% da movimentação de contêineres em 2016, ante 23,5% em 2010. "Diante desse quadro, aumentam os riscos de que os processos de consolidação e verticalização tragam efeitos para os usuários de transporte marítimo, ampliados por conta de o país estar fora das principais rotas e pelo tamanho limitado do mercado", ressaltou Andrade.




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